quarta-feira, 1 de abril de 2009

MELHORES DE 2008

ÁLBUNS (INTERNACIONAL)
01. "Third" – Portishead
02. “Fleet Foxes” - Fleet Foxes
03. "In Ghost Colours" - Cut Copy
04. "Saturdays=Youth" - M83
05. "Images of Sigrid" - Poni Hoax
06. "Dear Science" - TV on the Radio
07. “Hercules and Love Affair”- Hercules and Love Affair
08. "Dig Lazarus Dig!!!" - Nick Cave And The Bad Seeds
09. "Oracular Spectacular" – MGMT
10. "You and Me" - The Walkmen

ÁLBUNS (NACIONAL)
01) "Maré"- Adriana Calcanhoto
o2) "Chapter 9"- Ed Motta
03) "Japan Pop Show"- Curumim
04) "Terceiro Mundo Festivo"- Wado
05) "Orquestra Contemporânea de Olinda"- Orquestra Contemporânea de Olinda
06) "Toc ao Vivo no Teatro de Santa Isabel"- Vitor Araújo
07) "Sou"- Marcelo Camelo
08) "Contínua Amizade"- Hamilton de Holanda e André Mehmari
09) "Anormal"- Jonas Sá
10) "Amor e Caos"- Ana Cañas

SHOWS
01. Sonny Rollins - Tim Festival
02. The National - Tim Festival
03. Rufus Wainwright - Sala Cecília Meireles
04. MGMT - Tim Festival
05. Justice - Circo Voador
06. Spoon - Planeta Terra
07. Neon Neon - Tim Festival
08.The Jesus And Mary Chain - Planeta Terra
09. Foals - Planeta Terra
10. Klaxons - Tim Festival

FILMES
01. "Desejo E Reparação"- Joe Wright
02. "Onde Os Fracos Não Têm Vez"- Joel e Ethan Coen
03. "Batman- O Cavaleiro Das Trevas"- Christopher Nolan
04. "Um Beijo Roubado"- Wong Kar Wai
05. "Na Natureza Selvagem"- Sean Penn
06. "Personal Che"- Douglas Duarte e Adriana Mariño
07. "Não Estou Lá"- Todd Haynes
08. "Vicky Cristina Barcelona"- Woody Allen
09. "A Banda"- Eran Kolirin
10. "Paranoid Park"- Gus Van Sant

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Melhores Discos de 2008 (1001 Colóquios)

O percurso de 2008 é eminentemente noturno. Um acorde é emitido na hora zero numa praça onde um trovador solitário dedilha o seu violão. Ele acaba de chegar de um período de isolamento num local muito distante do caos urbano. A cidade parece ainda mais selvagem do que a floresta e a beleza de seus plácidos e desolados lamentos serve para purificar o cinismo da metrópole. Na estojo do instrumento, deixado num canto, algum transeunte lê a inscrição: Justin Vernon- For Emma, Forever Ago.

Dobrando a esquina, surge outro bardo, uma espécie de Dylan (guardadas as devidas proporções) gestado numa garagem. Ele entoa cânticos viscerais e tem como espectadores meia dúzia de gato pingados. O sujeito atende pelo nome de Hamilton Leithauser, vocalista da banda The Walkmen. A madrugada se arrasta quando o som de um órgão ecoa pela avenida vazia e revela “In the New Year”, uma das mais belas e contundentes músicas do ano. É o ápice de "You and Me", um álbum cru, minimalista na execução, cheio de levadas marciais e percussivas, mas não menos lírico.

Não muito longe dali, observa-se um fila em frente a um pequeno edifício onde antes funcionou um templo no estilo “Jesus Saves”. No interior o clima é hedonista. O público, em comunhão, celebra e grita no auge do êxtase, acompanhando os vocais de Antony: “... Because I Feel, Because I Feel... Blind!!!”. Em 2008, o carismático crooner, abandonou as suas típicas tendências melancólicas e ingressou com impressionante naturalidade nas fileiras de uma espécie de bem-sucedida retomada da disco music combinada com outros beats dançantes, house e jazz incluídos, capitaneada pelo projeto Hercules and Love Affair de Andrew Butler.

O ataque dos sintetizadores segue no andar de cima. O doce refrão de “Ready for the Floor” é entoado em uníssono. Apenas mais uma das melódicas e contagiantes, embora nada vulgares, canções do Hot Chip, que com o álbum “Made in the Dark” oferece mais um daqueles blends de tendências dançantes que eles são capazes de produzir com muita propriedade.

Retornando para a pista principal, um incidente, posteriormente saudado por todos, acontece. O DJ, num aparente surto de loucura, abandona seu posto e, resoluto, vai para a pista no intuito puro e simples de cair na gandaia, não antes sem deixar no repeat o álbum “In Ghost Colours” do australiano Cut Copy (o vice-campeão de 2008 no rank de 1001 Colóquios). Nada mais lógico e racional, já que a sucessão de hits, calcados em vertentes dançantes as mais diversas, oitentistas ou não, aí incluídos o synth-pop e mesmo a dance music mais bagaceira reprocessada, a ponto de tornar-se sofisticada, é viciante. No caldeirão borbulha um rica mistura de timbres variados de teclados e sintetizadores, na qual cabem até saxofones, vocoders e guitarras distorcidas. Uma coleção de canções luminosas. Lights and music. A expressão é certeira. Resume tudo.

Um luz branca ofuscante disparada diretamente nos olhos de um dos fanfarrões da pista é a senha para transportá-lo para uma realidade paralela envolta numa névoa espessa, o que dificulta a percepção de que está numa mata. Ele ouve inicialmente o barulho de um riacho correndo tranquilo, depois o cântico de pássaros e finalmente uma flauta árcade bem ao fundo. Seguindo o som emitido pelo instrumento, atinge um descampado onde está sendo promovido algo a que nunca tinha assitido: uma ensolarada jam session pastoral onde cabem sons típicos de bandas como Byrds, The Zombies e CSNY. As músicas soam autorais e cheias de personalidade, paradoxalmente. De repente, o vocalista entoa uma canção a capela, anunciada como "Oliver James", que combina apenas o silêncio entre as estrofes com os trinados de sua voz. A alucinação passa e no cérebro do fanfarrão o mantra “Fleet Foxes” é repetido à exaustão.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Show - JUSTICE


Data: 26 de setembro de 2008
Local: Circo Voador

Como se pronuncia "Justice"? "Djústice", ou coisa que o valha, em conformidade com a agressiva petulância do estilo anglo-saxônico, ou pura e simplesmente o "Justice" emitido pela vaidosa classe latino-gaulesa? Acompanhando a atual cena pop-rock-eletrônica francesa, plena de identidade e vigor criativo, não restam dúvidas: a segunda opção sai vencedora. Um dos pontífices dessa nova nouvelle vague, o duo Justice, deixa a sua contribuição inconteste para a afirmação da rejuvenescida personalidade musical francesa, como pude constatar no sensacional show realizado num Circo Voador quase lotado.
O espetáculo tem visual bem atraente. A dupla se apresenta num plano alto (uma espécie de púlpito) decorado com uma cruz luminosa (seu símbolo), operando a parafernália eletrônica adornada com luzinhas piscantes presepeiras e ladeada por dois paredões de amplificadores Marshall (18 no total), também eventualmente iluminados. O som estava ótimo e no talo (tímpanos em frangalhos agardecem). Os músicos, que parecem encarnar rockers em suas tradicionais e amadas roupas de couro, atuam em perfeita sintonia, mixando e recriando de forma fantástica. Ao vivo, as músicas tornam-se mais aceleradas e pesadas. Adquirem o status de verdadeiros petardos sônicos. D.A.N.C.E., por exemplo, se perde em groove, ganha, contudo, uma formatação inventiva e mais "suja" que a distancia do original. "We are Friends" é introduzida de forma clássica com a linha de baixo característica e o adicional do que parece ser o início de "Atlantis to Interzone" do Klaxons, seguida depois de um ataque de guitarras muito parecido com Ministry. Aliás, em vários momentos são utilizadas levadas e riffs típicos de metal.
Torço por uma nova invasão francesa nesses litorais cariocas. Outros conquistadores como Poni Hoax, M83 e Air poderiam atracar nessas plagas, assim como fizeram seus antepassados (certamente menos amistosos e talentosos).

Músicas de 2008 (em construção)

"Time to Pretend"- MGMT
"Kids"- MGMT
"Electric Feel"- MGMT
"Far away"- Cut Copy
"Hearts on Fire"- Cut Copy
"Lights and Music"- Cut Copy
"Feel the Love"- Cut Copy
"Antibodies"- Poni Hoax
"You Gonna Miss My Love"- Poni Hoax
"Kim and Jessie"- M83
"Blind"- Hercules and Love Affair
"Fancy Footwork"- Chromeo
"Elvis"- These New Puritans
"I'm not Gonna Teach..."- Black Kids
"Pussyfooting"- Fujiya and Miyagi
"Gamma Ray"- Beck
"TMNT Mask"- Chad Vangaalen
"Geraldine"- Glasvegas
"Sex on Fire"- Kings of Leon
"Dream Girls"- Neon Neon
"Stainless Style"- Neon Neon
"Cat and the Eye"- Van She
"Run"- Gnarls Barkley
"Sensual Seduction"- Snoopy Dog
"Come on Feet"- Pete and the Pirates
"Whiteboy"- James

Álbuns de 2008 (em construção)

INTERNACIONAL

Cut Copy- "In Ghost Colours"
Neon Neon- "Stainless Style"
Hercules and Love Affair
Portishead- "Third"
Poni Hoax- Images of Sigrid"
Bloc Party- "Intimacy"
Chad Vangaalen- "Stainless Style"
Fujiya & Miyagi - "Lightbulbs"
Glasvegas- "Glasvegas"
Kings Of Leon - "Only By The Night"
Lindstrom - "Where you go I go too"
Okkervil River- "The Stand-ins"
Paul Weller- "22 Dreams"
Peter Bjorn and John - "Seaside Rock"
Stereolab - "Chemical Chords"
The Hold Steady - "Stay Positive"
The Teenagers-"Reality Check"
The Ting Tings - "We Started Nothing"
The Uglysuit - "The Uglysuit"
The Verve - "Forth"
The Walkmen-"You & Me"
Tv on the Radio - "Dear Science"
Van She-"V"
Aimee Mann-"Smilers"
British Sea Power-"Do You Like Rock Music?"
Cat Power-"Jukebox"
Coldplay- "Viva La Vida Or Death And All His Friends"
Death Cab for Cutie - "Narrow Stairs"
Devotchka- "A Mad & Faithful Telling"
Foals- "Antidotes"
Fleet Foxes - "Fleet Foxes"
Hot Chip- "Made in The Dark"
Ladytron- "Velocifero"
M83- "Saturdays=Youth"
MGMT- "Oracular Spetacular"
Moby-"Last Night"
Nick Cave And The Bad Seeds- "Dig Lazarus Dig!"
Pete and the Pirates - "Little Death"
Ratatat- "LP3"
Sam Sparro - "Sam Sparro"
Shearwater - "Rook"
Spiritualized- "Songs in A&E"
Stephen Malkmus & The Jicks - "Real Emotional Trash"
Sun Kil Moon- "April"
The Last Shadow Puppets - "The Age Of The Understatement"
The Long Blondes- "Couples"
These New Puritans- "Beat Pyramid"
Vampire Weekend- "Vampire Weekend"
Wolf Parade- At Mount Zoomer
Atlas Sound- "Let the Blind Lead Those Who Can See But Cannot Feel"
Calexico- "Carried to Dust"
Gnarls Barkley- "The Odd Couple"
Paul Weller- "22 Dreams"

NACIONAL

Ed Motta- "Chapter 9"
Marcelo Camelo - "Sou"
Orquestra Contemporânea de Olinda
Curumin - "Japan Pop Show"
Adriana Calcanhoto- "Maré"
Wado

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Rock?

Rock é guitarra e theremin;
Rock é revolução e armação;
Rock é um bando de pirralhos e um velho jurássico;
Rock é auto-destruição e instinto de preservação;
Rock é um estádio lotado e uma garagem vazia;
Rock é transgressão e conformismo;
Rock é diversão e reflexão;
Rock é morte e hedonismo;
Rock é sarjeta e ribalta;
Rock é arte e lixo.

Universo em Miniatura

Soldados de chumbo enfileirados na porta do quarto, alertas, recepcionavam os visitantes que ousavam ultrapassar aquela fronteira. Um pouco mais à frente, policiais playmobil em decúbito (mortos?) descansavam. Nas imediações pontificava um forte-apache em cujo interior estavam misturadas em pandemônio cartas de Master e de Super-Trunfo. Um Odissey conectado à televisão- e momentaneamente ignorado- despejava imagens de “Didi na Serra Pelada”. A trilha sonora ficava a cargo do compacto que veio encartado na primeira edição da “Bizz” e era precariamente reproduzido pela vitrola Philips vermelha.O Garoto, senhor absoluto daquele território, deliciava-se naquele momento vivendo as emoções de uma final de campeonato carioca. Um golpe bem dado de palheta fez o botão número 10 vascaíno deslizar resoluto até o dadinho. O tirambaço que se viu estufou as redes do goleiro rubro-negro e sacramentou a goleada de 4 a 0. Sem dúvida, a diversão estava mais do que garantida.

Seleções

Os Convocados

Três escretes musicais inspirados no finado futebol arte.

Seleção Canarinho
Edison Machado (bateria); Naná Vasconcelos (percussão); JT Meirelles (saxofone); Paulo Moura (clarinete); Barrosinho (trompete); Zé da Velha (trombone); Jacob do Bandolim (bandolim); Hélio Delmiro (violão); Toninho Horta (guitarra); Dom Salvador (piano); Hermeto Pascoal (tudo).Técnicos/arranjadores- Tom Jobim e Moacir Santos.Mentor Espiritual- Heitor Villa-Lobos.Sede: Beco das Garrafas (Copacabana-Rio).

Rolo Compressor Jazzístico
Billie Holiday (vocais); Miles Davis (trompete); John Coltrane (sax tenor); Charlie Parker (sax alto); Thelonious Monk (piano); Charles Mingus (biaxo); Elvin Jones (bateria).Técnicos arranjadores: Gil Evans e Duke Ellington.Mentor espiritual: Jelly Roll Morton.Sede: Village Vanguard (NY).

Rock'n'roll Carrousel
David Bowie (vocais); Bob Dylan (vocais e harmonica); Jimi Hendrix (guitarra); Neil Young (guitarra); Jack Bruce (baixo); Robert Wyatt (vocais e bateria); John Cale (viola, violino e piano); Ralf Hütter e Florian Schneider (teclados e programações); Lev Sergivitch Termen (theremin); Bez (presepadas e fanfarronices).Técnicos/arranjadores: Frank Zappa e Brian Wilson.Mentores Espirituais: Robert Johnson; Hank Williams e Chuck Berry.Sede: As encruzilhadas.

sábado, 15 de março de 2008

Um publicação agora. Ou quem sabe mais tarde. Amanhã. Ou um ano depois. Tanto faz. Uma em quadrilhões de bilhões. Quantas por aí estão flutuando, ao léu, sem qualquer visita, a não ser a de seus pais? Penso nas mais desamparadas, as que sobreviveram aos seus genitores, as órfãs. E nas rebeldes, que bastam a si, libertas de grilhões. Será? Que ao menos poderiam ser garrafas flutuando num alto-mar de palavras, frases, cores e sons... Juradas, contudo, e então, a encontrar um porto seguro, um destinatário em qualquer lugar (Zimbábue?), em que tempo futuro for (2040?)... ?

Colóquio

Colóquio

Um nada.
Um silêncio.
Um vácuo.
Um limbo.
Um quadro negro.
Uma tela preta.

Um BIG BANG!

Um impulso.
Uma possibilidade.
Uma expectativa.
Uma palavra.
Um rumor.
Um primeiro.
Um colóquio em milhões.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

MELHORES DE 2007

FILMES
1) “A RAINHA”- STEPHEN FREARS
2) “NOTAS SOBRE UM ESCÂNDALO”- RICHARD EYRE
3) “BRASILEIRINHO- GRANDES ENCONTROS DO CHORO”- MIKA KAURISMÄKI
4) “BABEL”- ALEJANDRO GONZÁLEZ IÑÁRRITU
5) “CARTA DE IWO JIMA”- CLINT EASTWOOD
6) “A CONQUISTA DA HONRA”- CLINT EASTWOOD
7) “BORAT”- LARRY CHARLES
8) “O CHEIRO DO RALO”- HEITOR DHALIA
9) “RATATOUILLE”- BRAD BIRD
10) “MARIA ANTONIETA”- SOFIA COPPOLA

SHOWS
1- LCD SOUNDSYSTEM (CIRCO VOADOR)
2- CHICO BUARQUE (CANECÃO)
3- GOTAN PROJECT (CANECÃO)
4- BJÖRK (TIM FESTIVAL)
5- HOT CHIP (TIM FESTIVAL)
6- ARCTIC MONKEYS (TIM FESTIVAL)
7- MAGIC NUMBERS (CIRCO VOADOR)
8- KASSIN +2 (CIRCO VOADOR/ESTRELA DA LAPA)
9- CAETANO VELOSO (MORRO DA URCA)
10- MUTANTES (VIVO RIO)

ÁLBUNS (NACIONAL)
1) “FUTURISMO”- KASSIN +2
2) “DAQUI PRO FUTURO”- PATO FU
3) “FOME DE TUDO”- NAÇÃO ZUMBI
4) “BELO E ESTRANHO DIA PRA SE TER ALEGRIA”- ROBERTA SÁ
5) “FINO COLETIVO”- FINO COLETIVO
6) “CHROMOPHOBIA”- GUI BORATTO
7) “CARNAVAL SÓ NO ANO QUE VEM”- ORQUESTRA IMPERIAL
8) “ONDE BRILHEM OS OLHOS SEUS”- FERNANDA TAKAI
9) “HURTMOLD”- HURTMOLD
10) “MARINA DE LA RIVA”- MARINA DE LA RIVA

ÁLBUNS (INTERNACIONAL)
1) “NEON BIBLE”- THE ARCADE FIRE
2) “SOUND OF SILVER”- LCD SOUNDSYSTEM
3) “IN RAINBOWS”- RADIOHEAD
4) “COMICOPERA”- ROBERT WYATT
5) “BOXER”- THE NATIONAL
6) “MIRRORED”- BATTLES
7) “GA GA GA GA”- SPOON
8) “23”- BLONDE REDHEAD
9) “PERSON PITCH”- PANDA BEAR
10) “LET’S STAY FRIENDS”- LES SAVY FAV

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

"Wake Up"- The Arcade Fire

Uma visão fragmentada, caótica, tecnicamente imperfeita e única do hino "Wake Up", direto da memorável apresentação do Arcade no Tim Festival 2005.

Muito Mais Que Um Nome


Há um par de anos um nome foi soprado pelo vento e chegou aos meus ouvidos calejados. Em seguida vieram as canções, concomitantemente sombrias e pungentes. O lirismo de violas, violinos, violoncelos, xilofones, acordeons e harpas surgia em meio aos usuais guitarra, baixo e bateria. Num primeiro impacto fui tomado pelo estranhamento, mas não pela indiferença, impressão esta reforçada pelas letras que falavam de túneis impossíveis, de eletricidade (ou da falta dela), de vizinhança e até de vampiros. Elementos e metáforas inseridos nos conceitos de perda, inclusive a inexorável (a morte), de construção e de rompimento de vínculos que permeava todo o álbum, apropriadamente intitulado “Funeral”. Nele percebe-se uma melancolia invariavelmente atravessada por cânticos emocionados em uníssono, gerando uma visceralidade contagiante, característica esta imprescindível para entender o âmago da proposta artística.
Nos shows tudo fica ainda mais potencializado, ao nível do limite humano. Sons, palavras e performances ofertados como se fossem os últimos. Vislumbrados como uma benção única. O que vemos é uma comunhão ímpar. Os músicos trocam de instrumentos e de posição no palco de acordo com a canção a ser executada. Os dramas pessoais, as experiências dolorosas de perda relatadas nas músicas, tornam-se também da platéia que, contaminada, alça as canções ao patamar de hinos. “Wake Up”, a primeira delas, lança sobre todos uma corrente elétrica irresistível que irá cessar apenas ao fim do último acorde. Uma experiência encantadora, a princípio laica, que acaba assumindo ares religiosos.
Antologia essa é palavra. Arcade Fire: esse é o nome. Mais que um nome, é O NOME. A banda que marca o início desse século com a sua assinatura e que deixa claro que é possível fazer arte coerente e com conceito, abarcando desde a música propriamente dita até a concepção visual.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Lembranças Musicais

Entre uma curva e outra da estrada, a fita-cassete avançava junto com o Chevette 83, novinho em folha. A viagem fluia bem com aquela, que daquele momento pra sempre, foi e é a sua indissociável trilha sonora. Um cheiro de verde e um gosto de sol confraternizavam com as canções que inebriavam os pais e as crianças do banco de trás. Era uma sensação de vida. Ou melhor, uma certeza.
A cantora fascinava, proclamando: "Sei que nada será como antes, amanhã". Os filhos, cativados com as revelações incomuns aos seus universos, pediram bis. O pai obedeceu, sem pestanejar. Ouviram a moça repetir que queria uma casa no campo para compor muitos rocks rurais.
A fita foi tocada e rebobinada algumas outras vezes até a chegada ao destino, numa noite iluminada. A viagem e suas irmãs, as músicas, nunca acabaram. Estão aí até hoje. A família continua percorrendo o mesmo caminho. E a cantora permance com a mesma incontida emoção: "Para quem quer se soltar/Invento o cais/Invento mais que a solidão me dá".

Tempos

Sou avesso às celebrações passadistas que, vez por outra, cismam em aparecer. Fico incomodado com atitudes e pensamentos que buscam valorizar apenas o passado em detrimento do presente. São muitos os que rejeitam manifestações artísticas atuais sob o argumento de que elas se distanciam dos padrões estéticos pretéritos e não respeitam os cânones do tradicionalismo. Estes, os que tem calafrios diante do novo, até admitem ouvir ou ver uma obra atual desde que seja antiga (em seu caráter).
Por outro lado, também acho detestável o elogio raso do moderno. Como se a última tendência, recém-nascida, fosse o grito de genialidade que soterra tudo o que de interessante se criou. Dentro desse raciocínio, artistas e obras importantes para o desenvolvimento de certa arte são relegados ao limbo. Há os que assim pensam: "Que linguagem datada... O tempo deles já passou! Abram alas para os messias da contemporaneidade!"
Essas duas tendências também são evidentemente alimentadas pela grande mídia em parceria com a indústria do entretenimento, as quais se numa vertente, ao manipularem uma suposta memória afetiva coletiva, estimulam o retorno, não de artistas, mas de produtos (e esse é o termo preciso), em movimento contrário, "criam" outros com um roupagem modernosa, prontos para a conquista de corações, mentes e bolsos dos vanguardeiros de plantão.
E onde eu fico nisso? Não me identifico com nenhuma das duas "correntes". Estou numa zona não identificada? Para os que acreditam em bipolaridades maniqueístas, certamente. Busco não raciocinar em termos simplistas. Tenho a pretensão de querer apagar as fronteiras temporais. Afirmo, portanto, que não rejeito o antigo, e tampouco o novo (e, nem a priori, o que há de vir). Sou capaz de alçá-los à condição de peças fundamentais, que me são indissociáveis, se descubro, se reconheço, se intuo neles a marca do brilho do invento concebido de forma íntegra. E sendo assim, se algo de tal grandeza me é ofertado, por que falar de limites, de grilhões de tempo? O filme, o disco, o livro, a pintura, estarão aferrados à eternidade, superando os conceitos de passado, presente e futuro. E a eternidade paira sobre o tempo que criamos e ao qual devemos obediência.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

"Daqui pro Futuro"- Pato Fu. Faixa a Faixa.


O Pato Fu ataca de novo, bem ao seu estilo mineiro- e agora independente. Lançou recentemente, e sem maiores alardes, "Daqui Pro Futuro", um álbum saboroso, que confirma a sua maturidade. É um atestado de sua consolidação como um grupo ímpar na cena nacional, que sabe imprimir como poucos uma marca autoral. Isso é peceptível tanto na musicalidade, quanto nos marcantes vídeos e na concepção geral artística que o envolve.
Deparamos agora com uma insuspeita coleção de canções pop de acabamento refinado. O disco é todo homogêneo. Transita entre sensíveis baladas e músicas mais dançantes. As intervenções eletrônicas estão presentes. De forma sutil, contudo. Não há pontos de queda. O nível de interesse é mantido uniforme durante toda a execução. Pra quem, que como eu, reclamava que o ano naufragava em marasmo no universo pop/rock nacional, está aí um disco que merece ser louvado, talvez mesmo como o melhor do ano até o momento. Basta sorver cada uma das canções.

Faixa 1- 30.000 Pés- A guitarra bluesy e o teclado, que remete a um clima onírico e pontuará a canção, abrem a primeira faixa. Letra e música levam a uma sensação de liberdade. A guitarra de John Ulhoa, sem dúvida um dos mais brilhantes músicos brasileiros, é o destaque, "comentando" todas as passagens da música com maleabilidade impressionante. Esse é o ponto de partida para o verdadeiro espetáculo que ele porporcionará até o final do álbum.
Faixa 2 - Mamã Papá- A letra fala da experiência da paternidade/maternidade. Provavelmente é autobigráfica, considerando que John e Fernanda Takai são casados- e pais. O ritmo aqui é contagiante e animado. Ouve-se um piano desinibido. O baixo pulsa. À voz de Fernanda são adicionados ecos. Percebem-se sons de brinquedos de bebê no fundo.
Faixa 3- Espero- A música é iniciada com acordes de harpa, que depois são amalgamados à frágil voz de Fernanda. Surgem cordas e uma discreta programação eletrônica. Backing vocals femininos susurrados secundam a vocalista. O resultado é intimista e comovente.
Faixa 4- Cities in Dust- Ótima regravação do hit de Siouxsie and The Banshees. O grupo habilmente não incorreu nos erros freqüentemente constatados em versões cover. Não regravou a música à imagem e semelhança do original, sem acrescentar nada portanto, nem criou uma versão que desfigurou a primeira completamente. O ritmo é bem delineado pelo baixo, produzindo uma balanço não presente na música regravada.
Faixa 5- Tudo vai ficar Bem- Parceria com Andrea Echeverria da banda colombiana Aterciopelados. Começa minimalista. Depois assume uma latinidade irresitível e repaginada. As engenhocas eletrônicas utilizadas parcimoniosamente por todo disco marcam presença mais uma vez. A guitarra de John soa rítimica casando bem com a percussividade geral.
Faixa 6- A Hora da Estrela- Referência ao universo de Clarice Lispector. Clima de penumbra. As luzes baixam depois da vivacidade anterior. Mais uma sofisticada balada. Pode ser considerada a seqüência estética de "Espero". Belíssimo trabalho de guitarra em que uma postura contida, porém cheia de técnica, também está concomitantemente impregnada de emoção.
Faixa 7- Woo!- Fogo na pista. O compasso muda mais uma vez. A faixa glam do disco. Riff marcante. Guitarras em ebulição. Batidas eletrônicas aceleradas. Vocais insinuantes. E um assumido clima de celebração. Diversão pura.
Faixa 8- A Verdade Sobre o Tempo- Flautinhas pastorais e psicodélicas, um piano de brinquedo, solos de slide guitar, devaneios sobre a vida que flutuam na melodia viajante. Essa é a história dessa música.
Faixa 9- Quem Não Sou- O Patu Fu envereda pelo synth pop. Bateria e barulhinhos eletrônicos, frases de teclado e seqüenciadores. Em certo momento surge até uma "escorregadia" cítara que gera uma atratividade extra.
Faixa 10- Vagalume- A música mais singela do disco. Quase que uma canção de ninar. Tem uma pureza invulgar. Uma doçura própria só das crianças. O pianinho de brinquedo e a voz de Fernanda são decisivos para essa impressão.
Faixa 11- Nada Original- Seria somente mais uma canção pop, com ganchos evidentes e refrão marcante, não fossem a sua riqueza melódica, a rica interação de instrumentos e as tramas de guitarra.
Faixa 12- 1000 Guilhotinas- Programações "amaciadas" e acordes delicados criam uma canção em tom de fábula, em que a suave sonoridade contrasta com a temática abordada (a guerra).

domingo, 12 de agosto de 2007

Goldie - Innercity Life

A música profundamente enraizada na cidade com reflexos no espaço. Vocais de D. Charlemagne.

A Inner City Life de Goldie


Goldie, o bizarro homem dos dentes de ouro, que já esteve no Brasil há dez anos no finado Free Jazz Festival, lançou em 1995 um dos álbuns responsáveis pela consolidação da música eletrôncia, o antológico "Timeless". Considero esse disco tão importante e influente quanto "Blue Lines" (Massive Attack), "Dummy" (Portishead), "Planet Exit Dust" (Chemical Brothers), "Moon Safari" (Air) ou "Endtroducing" (Dj Shadow), respeitados os nichos/particularidades de cada qual e considerando apenas os beats, samples e loops a irmaná-los. O jungle e o drum'n'bass foram a partir de então catapultados. Suas batidas quebradas e contagiantes ganharam popularidade em pistas de todo mundo e foram adotadas como elementos secundários em músicas de viés mais pop-comercial, impregnando até uma certa bossa nova repaginada num formato mais eletrônico. Outros nomes imprescindíveis nessa cruzada foram Roni Size, responsável pelo clássico "New Forms" de 1997, o sinistro Grooverider, pai das marteladas mais tonitruantes do drum'n' bass, e LTJ Bukem.

"Timeless" foi de tal forma marcante, que o próprio Goldie nos anos seguintes falhou em produzir algo que superasse a sua primeva obra. Parece que o magnetismo dela impediu qualquer avanço posterior significativo. Prova disso foi o que veio em seguida: o disco duplo "Saturnz Return" que em sua despropositada grandiloqüência foi um grande passo em falso. Hoje, Goldie vive num certo ostracismo, sem lançar nada de impactante.

Se "Timeless" é isso tudo, a sua primeira música homônima, uma suíte de prazerosos vinte e um minutos, composta de três passagens, é a sua carta de intenções. A primeira delas, "Inner City Life, é também a mais envolvente. O clima elegante, urbano e noturno, algo espacial, enraizado nas tradições da black music, combinado com os irresistíveis broken beats, não deixa pedra sobre pedra.

sábado, 14 de julho de 2007

Primoroso Início de Pan

Nada menos que antológica a cerimônia de abertura dos Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro no Maracanã. Músicas escolhidas a dedo, pinçadas de nosso riquíssimo acervo. Ouviu-se muito chorinho, samba, Pixinguinha, Ari Barroso, Villa-Lobos, Tom Jobim. Artistas respeitáveis como Elza Soares, Chico César, Arnaldo Antunes e Adriano Calcanhoto se apresentaram, assim como os talentosos e emergentes Céu e Cordel do Fogo Encantado. Teve também a internacionalmente conceituada OSB nos momentos orquestrais. Ótimo. Não houve espaço para presepadas. Apostaram na música verdadeiramente representativa do Brasil. E aí a alma carioca foi materializada no espétaculo. Assim como a brasileira. Tudo combinado com impactantes e criativos efeitos visuais. Destaque para a praia e mar criados em pleno estádio, enquanto Céu, em pessoa, cantava "Wave" em uma versão que repaginou a original
Abstraiamos, as possíveis, digamos, "falhas", detectadas na organização do Pan. O fato é que fiquei surpreso com um espetáculo que em nenhum momento gerou tédio (mesmo nos discursos virtualmente protocolares, como veremos adiante). Foi comparável à abertura das Olimpíadas de Moscou em 1980. Uma das mais memoráveis cerimônias esportivas já organizadas. Uma festa que homenageou personalidades realmente admiráveis e exemplares, que sempre primaram pela ética e pelo olimpismo, como Vanderlei Cordeiro de Lima e Joaquim Cruz.
Falando nisso... Ou melhor, falando no contrário disso.... A cereja do bolo ficou por conta do "Nosso Guia" (crédito a Elio Gaspari, ou seria ao Ministro de Relações Exteriores?), mais conhecido como Presidente da República Federativa do Brasil, ou simplesmente o bom e velho Lula. As robustas e reiteradas vaias que recebeu quando seu nome foi anunciado por autoridades esportivas foram de lavar a alma. Devem continuar ecoando em seus ouvidos até agora. Geraram quebra de protocolo sem precedentes. Quem sabe ele não busca algum conforto pelo constrangimento com seus conselheiros do deserto de isolamento que é Brasília? O próspero pecuarista e presidente do nosso fulgurante Senado, o ilustre Renan Calheiros, talvez. Ou até mesmo os velhos companheiros mensaleiros que tanto protegeu, ou então Dirceuzinho ou Marta "Relaxa e Goza" Suplicy. Enfim, os apupos foram um complemento saboroso para um prato refinado.

domingo, 1 de julho de 2007

A Melhor Banda do Mundo

Dados impressionantes sobre a Melhor Banda do Mundo, coletados por um analista financeiro de Wall Street e divulgados pela Diretoria de Marketing e de Relações com Investidores de uma respeitadíssima gravadora transnacional, visando à captação de recursos financeiros através da emissão de debêntures conversíveis em ações:
1) A cada 15 minutos uma de suas canções é executada nas rádios, graças a inteligentes e eficientes parcerias celebradas entre estas e a sua gravadora;
2) Além das referidas parcerias, outros convênios extremamente espontâneos foram firmados com a mídia impressa e televisiva. O resultado foi a venda, em média, de 20 milhões de cópias de cada um de seus álbuns;
3) Em suas apresentações lota estádios gigantescos, seja na Europa, nos EUA ou em Hong Kong;
4) Foi anunciado recentemente, em entrevista coletiva, realizada em Dubai no hotel mais luxuoso do mundo, mais conhecido como “Burj al Arab”, que seu próximo show terá efeitos especiais de última geração desenvolvidos pela empresa “Industrial Light and Magic” de George Lucas. Técnicos da NASA também foram contratados para compor o numeroso staff de 300 pessoas, entre as quais estão roadies, groupies, camarareiras, cabeleireiros, manicures, chefs de cuisine, além de 15 músicos de apoio;
5) Seu faturamento anual médio é de cerca de 200 milhões de dólares. Uma bem sucedida parceria com uma renomada rede fast food que lançou miniaturas dos músicos numa promoção "casada" para o lançamento de seu novo sanduíche "almost fat free" junto com o novo álbum foi uma importante fonte de arrecadação;
6) Os componentes do grupo estão há 10 (anos) consecutivos na lista da “Forbes” de personalidades do meio artístico mais ricas do mundo;
7) Ganhou cerca de 10 prêmios Grammy nos últimos 2 anos. Um recorde absoluto;
8) A magnitude desse artistas é tal que em razão desse exíguo espaço não será possível declinar, por ora, outros números de suma relevância. Considerando que o leitor indubitavelmente estará interessado em conhecê-los, recomenda-se a leitura do número mais recente da revista “The Economist” (edição especial “A Banda”- gráficos de desempenho incluídos). Já nas bancas.
P.s: Informações referentes a identidade e proposta artística, musicalidade, poesia, criatividade, capacidade de reflexão e assemelhados foram desconsideradas nesse estudo por serem irrelevantes para a gravadora, para os parceiros de jornais, rádios e televisões, assim como para a própria Melhor Banda do Mundo, que tem mais o que fazer.

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Posters Históricos (I)

A arte expressionista-futurista do poster prenuncia o impacto estético causado pelo alemão Fritz Lang nas telas de cinema com a obra-prima "Metrópolis", de 1927.

quinta-feira, 28 de junho de 2007

A Rainha


Fui assistir ao filme "A Rainha" sem maiores expectativas. Talvez porque o tema monarquia não me desperte grande interesse. É evidente que existe pelo menos um filme soberbo sobre monarcas: o antológico "Ludwig" (lançado pela Versátil em sua versão integral e com extras). Porém, o personagem retratado era outro, virtualmente muito mais rico em particularidades, e o diretor o gênio Luchino Visconti.

Na película em questão o cineasta é o bom, porém desprovido daquela centelha de talento que faz a diferença, Stephen Frears, e os retratados são a Família Real Inglesa e tudo que lhe é inerente, figuras que considero desinteressantes, como o Príncipe Charles, Camila Parker Bowles e mesmo a "santificada" Diana.

Mas... Enfim, agora aconteceu comigo o inverso do que ocorreu quando vi "Alta Fidelidade", dirigido pelo mesmo Frears. Neste último entrei no cinema com grandes esperanças e sai francamente decepcionado. Já "A Rainha"... É, sem dúvida, um dos grandes filmes do ano! Não vou nem falar na já tão elogiada atuação antológica de Helen Mirren, que incorpora até os trejeitos corporais de Elizabeth II, nem das performances de todo o elenco. Perfeitos. A narrativa, adequadamente, não busca maiores inovações ou rupturas. Nesse caso nem era necessário. A trama casa bem com o estilo de Frears, um cronista de costumes, especialmente dos britânicos (aqui magistralmente capturados, principalmente os maneirismos da realeza).

O roteiro de Peter Morgan é um primor. Muito bem amarrado, sem deixar arestas. Os diálogos sagazes. Não é à toa que mesmo o espectador mais cético, como eu, fica magnetizado durante toda a projeção, do início até o desfecho final, mesmo conhecendo fatos que são notórios e que já fazem parte da história recente da humanidade. A abordagem é muito inteligente. Um achado. O que estariam pensando os grandes protagonistas daquela história em seu espaço privado, onde decisões de interesse público são tomadas, e ao qual nenhum súdito "mortal" tem acesso? Como estariam agindo por trás da fachada do comportamento oficial?

O filme especula, de forma absolutamente crível, sobre os bastidores pessoais e políticos, aos quais somos transportados, da tragédia que foi a morte da princesa Diana. Desloca o foco para o poder e humaniza os seus detentores, a Rainha Elizabeth II e o então primeiro-ministro Tony Blair. A figura do governante é posta em jogo. Temos uma monarca presa a tradições e códigos secularmente arraigados, acuada pelo clamor popular que exige que a realeza preste as devidas homenagens à Princesa Diana, sob pena de a Monarquia Inglesa sofrer sérios abalos em sua credibilidade.

Dentro dessa abordagem, a rainha não oprime, mas, diante de todas as pressões, sente-se oprimida. Está em xeque. Subjacente à morte de Diana, surgem tensões entre a necessidade de manutenção do rito/tradição e o imperativo, emanado do povo, de um reinado mais progressista. Blair, o primeiro-ministro trabalhista surge, incialmente, como o contraponto ao comportamento dos monarcas. É a lufada de renovação necessária. No entanto, à medida que o filme se desenvolve, torna-se, com sua habilidade política, um conselheiro informal da rainha, já que vislumbra um panorama de instabilidade institucional (que deseja evitar) caso a Família Real reitere seu posicionamento. Consegue que Elizabeth II finalmente ceda. O que ocorre, portanto, é um movimento de aproximação. Se antes tínhamos Chefes de Governo e de Estado em clássicas posições antagônicas (conservadorismo versus progressismo), ao final do processo temos governantes mais próximos. Elizabeth II ganha um "verniz" modernizante, enquanto Blair ostenta um perfil "trabalhista, ma non troppo".

Afinal, ambos não são tão diferentes. E isso é lembrado pela rainha no brilhante e memorável diálogo final, quando a personagem, lançando mão da fina sutileza que lhe é peculiar, sugere ao primeiro-ministro que um dia poderia ser ele a entrar na berlinda. Coisas do poder. Dito e feito.

terça-feira, 26 de junho de 2007

Gotan Project - Mi Confésion

Clipe de Mi Confésion. No Canecão os rappers eram virtuais, porém interagiram com pefeição com os músicos de carne e osso do Gotan.

Gotan Project no Canecão


O Gotan Project proporcionou na última quinta-feira um espetáculo inebriante no Canecão, infelizmente ignorado pelos indigentes cadernos culturais de jornal (a crítica impressa morreu definitivamente por aqui?). A banda franco-argentina, que criou o crossover tango com beats eletrônicos (e foi massivamente copiada posteriormente), subiu ao palco com piano, violinos, cello, bandoneon e violão irmanados com pick ups e parafenália eletrônica. Lançou sobre os espectadores da casa de shows, totalmente lotada, o lirismo e a tradição do tango combinados com levadas de dub e hip hop, samples e batidas sintéticas. Nesse caldeirão o tango saiu valorizado, revitalizado, e não violentado, como alguns puristas podem achar. Nem mesmo o torpor que a lounge music pode por vezes ocasionar, e com a qual o Gotan pode superficialmente ser associado, fez-se presente.

O clima de empolgação foi contínuo. O público urrava, assobiava, aplaudia longamente no final das músicas, gerando um evidente contentamento nos ótimos músicos. As canções, pinçadas dos discos "La Revancha del Tango" e "Lunatico", revelaram-se absolutamente magnéticas ao vivo, talvez por serem ainda mais realçadas pela grande sacada que foi a projeção de vídeos no fundo do palco, que serviam como comentários das mesmas (em "Lunatico", aparece um páreo de corrida em alusão ao cavalo de mesmo nome de Carlos Gardel) ou então como artifício interativo (rappers virtuais projetados que, de forma incrível, dialogam com o que está sendo apresentado no palco e entram rimando no tempo certo da música).

Foi, enfim, uma performance inesquecível de TAN-GO do GO-TAN.

The Gossip - Standing In The Way Of Control

Comandado pela carismática e algo bizarra Beth Ditto (tenho a intuição de que ela e Amy Winehouse poderiam ser amigas inseparáveis), o The Gossip, banda radicada em Olympia e apontada pela revista inglesa "Q" como uma das mais interessantes atualmente (ao lado de, entre outros, Arcade Fire, Arctic Monkeys e Kings of Leon), tem em "Standing in the Way of Control", a sua canção mais bem resolvida e deveria ser adotada como parâmetro para os seus futuros álbuns.
São pouco mais de quatro minutos em que a fúria e a energia do punk casam com perfeição com passagens funkeadas, sob as benções dos marcantes e urgentes vocais de Beth. A música é contagiante, "pega" logo na primeira audição, tem "gancho". É capaz de ser incendiária, como pude ver na Pista 3 recentemente, quando todos cantaram em uníssono.
A música está presente no bom disco homônimo (exceto pela capa tosca) lançado pelo Gossip em 2005. Veja acima a performance do Gossip executando "Standing" em Nova York no Knitting Factory.

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Rockers


Traduzir em imagens o som do rock'n'roll. É o que as fotos de Bob Gruen porporcionam. Várias delas estão ao nosso alcance através das reproduções contidas no bem acabado álbum "Rockers" editado pela Cosac Naify, gerado a partir de mostra exibida na FAAP, em São Paulo.
Gruen foi o fotógrafo oficial de John Lennon por nove anos. Fotografou também os mais diversos artistas, seja no palco, seja nos bastidores, razão pela qual é considerado um personagem essencial do universo pop/rock. Seu trabalho é historicamente relevante. Capta a alma e a evolução desse gênero musical. The Who, Led Zeppelin, Rolling Stones, Patti Smith, New York Dolls, Michael Jackson, Chuck Berry, Kiss, Marvin Gaye e muitos outros não escaparam de suas lentes.
Os flagrantes da emergente cena novaiorquina do punk rock nos anos 70 servem como uma versão ilustrada, vívida e complementar do livro "Mate-me, por favor", cujo assunto é idêntico. Estão lá bandas como Ramones e Blondie tocando nos "templos" CBGB e Max's Kansas City.
Outros instantâneos antológicos estão presentes no livro. Um exemplo são os registros de Sid Vicious, que conseguem captar a aura patética e vazia do baixista dos Sex Pistols. Ou mesmo a marcante foto do Clash em ação. Quase dá pra ouvir os acordes de "London Calling"... Ou então Jimmy Page solando sua guitarra de dois braços. A lamentar apenas a publicação de uma foto do nosso charada brasileiro, mais conhecido como Supla. Figura importante na história do rock? Ahnn, claro que sim... Ele foi o curador da mostra de Gruen na FAAP.

Luzes sobre uma "estrela"

Flash 1: A culta e bem informada estrela, de nacionalidade norte-americana, casada com um dos inúmeros filhos de Bob Marley e que atende pelo nome Lauryn Hill, ex-integrante dos Fugees, atualmente em empreitada solo, chega ao Brasil. Minutos depois pede US$ 10.000,00 a seu empresário para gastar por aqui, pois não trouxe cartões de crédito. Disse não saber que tal forma de pagamento era aceita por aqui.
Flash 2: Tendo sido solicitada uma entrevista pela Globo, responde que só a daria caso o entrevistador fosse negro. Será que ela queria dar uma força pro regime de cotas raciais? Uma grande prova de engajamento! Malcolm X perde.
Flash 3: Lauryn chega a um estúdio de gravação toda vestida de preto e com uma touca ninja. Diz que não quer ser importunada e acrescenta que não permite que ninguém lhe dirija o olhar. Tá certo, claro! Ela não é uma superstar?
Flash 4: Dia do tão aguardado show no Vivo Rio. Os espectadores, devidamente paramentados ao estilo de sua ídola, e que desembolsaram R$160,00 para vê-la, aguardam duas horas e meia até que a divindade suba ao palco.
Flash 5: Começa o espetáculo. Lauryn está rouca e praticamente não se dirige ao seu público. Está sem voz? Isso é apenas um detalhe perdoável...
Perguntar não ofende: o que Lauryn Hill veio fazer por aqui? Destilar a sua miseducation? Acho que conseguiu. Muita gente deve estar achando o máximo.

Calor


Calor é o nome do livro recém-publicado pela Companhia das Letras e que, desde já, é uma das publicações mais interessantes sobre gastronomia disponível no mercado. O autor é Bill Buford, prestigiado jornalista norte-americano, que relata a sua experiência como aprendiz de cozinheiro num restaurante três estrelas de Nova York, o Babbo, cujo proprietário é o renomado Mario Batali.

A princípio, Buford revela os bastidores frenéticos da cozinha de um conceituado estabelecimento. Nesse aspecto não chega a ser tão original assim. Isso já foi feito em livros como "Cozinha Confidencial", de Anthony Bourdin e mesmo em programas televisivos no estilo do reality show capitaneado por Gordon Ramsay. A diferença é que "Calor" traz um bem delineado retrato de um amador, que simplesmente abandona o seu bem-sucedido ofício de editor de respeitadas revistas, para submergir num universo completamente estranho e hostil e, não obstante, adquirir o jogo de cintura necessário para sobreviver nesse meio, aí incluidas técnicas culinárias absorvidas na dura labuta diária de um restaurante, sendo, ao final, igualmente bem-sucedido.

O Babbo, seus funcionários e Mario Batali são a linha mestra que estrutura o livro e conduz o leitor por episódios curiosos, engraçados e altamente informativos. Através deles Buford acaba parando na Itália. Lá, trava contato com a tradição da culinária da "Bota". Aprende, in loco, a arte da confecção das massas. Conhece receitas passadas de geração para geração. Viaja para a Toscana, onde "estagia" no açougue de Dario Cecchini, considerado o melhor açougueiro do mundo e ferrenho defensor do terroir da região do Chianti.

As estadias do autor na Itália acabam servindo de contraponto ao ritmo febril do novaiorquino Babbo, onde a combinação de qualidade diferenciada - personificada nas criações de Batali - com eficiência máxima é o vetor principal (imperativo de preparação dos pratos com perfeição em tempo curto, mesmo que de forma pouco artesanal, isto é, com a utilização de máquinas e não completamente fiel ao facere italiano, como no caso das massas). Em Poretta e na Toscana, os seus tipos, representados com exatidão na figura de Cecchini reafirmam a força da tradição, de uma cultura culinária profundamente enraizada e plena de identidade. À maneira de seus antepassados, produzem suas massas manualmente. Realizam cortes de porcos e bois segundo as suas próprias técnicas amplamente consolidadas.

O livro tem, portanto, esse aspecto pendular. Aborda a excelência de concepções diferenciadas de preparo das universalmente apreciadas refeições italianas. Mosta o porquê da feitura da comida ser também revelador do modo de ser das pessoas.

Cobrindo toda essa suculenta trajetória, são salpicadas informações sobre estrelas da culinária italiana como o tomate, a polenta e a bisteca fiorentina, e apresentados personagens essenciais para a gastronomia e para a cultura ocidental, como Maestro Martino e outros autores da Renascença.

quarta-feira, 6 de junho de 2007

Há Vida inteligente Longe dos Holofotes

Ligo a televisão. Começo a zapear na busca de algo relevante. Nada. Os espaços já estão loteados entre os velhos conhecidos donos do poder da indústria do entretenimento. Produção em massa. Artistas (?) gestados em escritórios comandados por yuppies e fabricados em linhas de montagem dominam a programação. Eles querem ser os mais vendidos... Não fazem questão de tocar seu coração, mas principalmente o seu $$$...
A deusa-besta da axé music, cujo nome não vale a pena declinar, foi feita ubíqua agora que diz ter igualado o feito de Madonna... Já chegou ao topo. O céu não é mais o limite para ela. Natural: o mérito de um artista dentro dos cânones da indústria continua sendo medido unicamente pelo número de discos e Dvds vendidos, não pela relevância ou qualidade do que é produzido. Bem, essa é um lógica perfeitamente justificável quando se quer vender cheeseburgers...
E tome entrevistas de conveniência nos mais diversos canais, resenhas elogiosas em publicações musicais, participações em programas flagrantemente jabazentos ou supostamente respeitáveis! As músicas toniturantes executadas em todas as rádios sem-vergonha que assolam o dial. E, como não bastasse, a vida privada dessas "celebridades" querendo invadir o espaço público em pasquins de fofoca. E tome poeira, muita poeira, provinda de Tvs de LCD, nos ouvidos e nos olhos dos incautos que pretendem comprar o seu Orhan Pamuk ou o seu Charlie Parker em paz numa grande rede como a FNAC!
Nada de novo. Sempre foi assim. O lixo continua a ser imposto sem piedade. Até mesmo velhos críticos do status quo são cooptados e, incoerentes, gravam Acústicos MTV e voltam de braços abertos ao porto seguro das rádios. A propósito, falando em MTV, vale a pena citar Caetano que, disparando há alguns anos atrás, acertou no alvo do futuro sem querer: "Vergonha na cara Emetevê!!!"
A diferença agora é que mesmo com as virulentas estratégias de promoção tradicionalmente praticadas, as vendas de álbuns de vários contratados sedentos em beneficiar-se delas mantêm-se incipientes. Apenas alguns "fenômenos" conseguem se segurar. E não por conta de sua qualidade artística, mas tão somente por uma eventual, inescrupulosa e violentíssima campanha de marketing, expressa em mecanismos freqüentemente ilegítimos. É o caso da já mencionada baiana, metade deusa, metade besta.
Alguns, diante desse panorama lamacento, não muito distante da degenerescência que assola o país nos mais diferentes níveis, trombeteam que a música brasileira está em crise. Tal assertiva está correta apenas em parte. Seria melhor formular assim: a música brasileira do establishment, dos apadrinhados de sempre anda muito mal das pernas dentro do que se propõem (vender a qualquer custo sem outras preocupações mais elevadas). Porém, há vida inteligente longe dos holofotes. Sempre houve. E agora ela está mais acessível do que antes. Isso em grande parte devido aos meios alternativos de divulgação, notadamente a Internet e todas as ferrmentas que lhe são inerentes, assim como também às facilidades tecnológicas de gravar discos, inclusive em estúdios caseiros. É provável que grandes artistas tenham no passado sido relegados ao ostracismo devido à dificuldade em chegar ao consumidor de bens culturais, em razão da inexistência de vias alternativas sólidas. Hoje, pelo menos uma parcela do público que não se contenta com o "fast food nosso de cada dia" que lhe é oferecido, pode realizar um verdadeiro trabalho de peneira e encontrar jóias de valor inestimável. O negócio é revolver a camada espessa de gordura descartável e achar cantores, cantoras e bandas que priorizam o ato de criar, a excelência do que produzem, em detrimento do vale tudo pelo sucesso.
É o caso de Kassin+2 e Mombojó que no último sábado, no Circo Voador, deram uma prova contudente da vitalidade dessa nova música brasileira. Os primeiros, confirmando o que registraram em Futurismo, um dos grandes álbuns de 2007, processam com competência as inspirações trazidas por mestres como João Donato, Marcos Valle, Ed Lincoln, Banda Black Rio, com música latina e até hardcore, criando algo genuinamente criativo e instigante. O Mombojó não ficou atrás e ofereceu uma performance visceral, em que os violões, cavaquinhos e flautas do samba e do choro, além das interferências da música eletrônica, interagem com os clássicos guitarra, baixo e bateria furiosos. São uma pequena amostra, afortunadamente.
É fácil mencionar outros: Cordel do Fogo Encantado, Cidadão Instigado, mundo livre S.A., Nação Zumbi, Gui Boratto, Vanguart, Violins, a "família" Orquestra Imperial, Wado/Fino Coletivo, Hurtmold, Nervoso, Móveis Coloniais de Acaju...Assim como o fora de série Los Hermanos que faz parte do cast de uma major- exceção que confirma a regra. Vale destacar as cenas de Recife, de Goiânia e de outras cidades fora do eixo Rio-São Paulo. Saindo do nicho pop/rock, pontificam Guinga, Yamandú Costa, Hamilton de Holanda, Rômulo Fróes, Marcelo Campello (também violonista do Mombojó) e a nova geração de sambistas sediados na Lapa e adjacências. E os inúmeros artistas da Biscoito Fino, uma das poucas gravadoras respeitáveis atualmente. Todos esses fazem companhia a movimento similar que se desenvolve em âmbito internacional, do qual o representante máximo é o canadense Arcade Fire.

quarta-feira, 30 de maio de 2007

Novos Ecos dos Beach Boys

Em sua primeira empreitada solo, o álbum "Yours to Keep" (2007), Albert Hammond Jr., guitarrista do Strokes, revela-se tributário à sonoridade ensolarada dos Beach Boys e do pop-rock lisérgico da virada dos 60 para os 70. Há, portanto, uma mínimo ponto de contato com o disco de Panda Bear. A diferença aqui, diga-se de passagem, radical, reside no fato de que todas as canções são extremamente assimiláveis, longe de experimentalismos. Têm curta duração e possuem aquele gancho próprio das canções pop. Esta pequena palavra-rótulo, pop, contudo, deve ser entendida nesse particular longe de seu sentido depreciativo, mas sim como geradora de músicas bem encadeadas, dotadas de estrutura definida, melódicas e leves. Os sons levam à placidez e tranqülidade de espírito. Há assobios e "la-la-las".
Por sinal, esse clima de doçura já é anunciado logo na capa: um improvável desenho de uma floresta banhada pelo sol sob os olhares de coelhos... Nada mais anti-Strokes, paradoxalmente. O disco está a léguas do universo urbano, novaiorquino, soturno, sujo e nervoso da banda de origem de Hammond. Se bem que em "First Impresions of Earth", o Strokes flertou em algumas faixas com levadas próprias da surf music. Influência de seu guitarrista, talvez.
O fato é que "Yours to Keep" é, em sua trabalhada simplicidade, uma obra divertida, agradável e surpreendente, inclusive com bons vocais de Hammond.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

O nome do disco é "Person Pitch"- Panda Bear

Esse álbum, recentemente lançado por Panda Bear, alter ego de Noah Lennox, integrante do Animal Collective, promove uma viagem psicodélica, calcada na sonoridade dos Byrds e mais flagrantemente nos Beach Boys. Talvez por este fato, apesar de seus experimentalismos, tenha um viés "ensolarado". A influência da música oriental também é patente. A primeira faixa "Comfy in Nautica" lembra um mantra lancinante.
São apenas sete canções e algumas delas ultrapassam os dez minutos de duração. Aliás, não sei se seria apropriado falar em canção no sentido estrito da palavra. Fiquei com a impressão de que na verdade a intenção é apresentar painéis sonoros. Há uma linha mestra musical que é sobreposta por intervenções de ruídos e de instrumentos que tomam a linha de frente. Os vocais adocicados e assobiáveis ficam freqüentemente em segundo plano. São parcialmente diluídos e passam a "pairar no ar", enquanto os outros elementos sonoros prevalecem. Ao final de "Take Pills", por exemplo, a melodia é simplesmente varrida pelo barulho de um vento.
Não é um disco facilmente assimilável e requer concentração exclusiva do ouvinte. É bastante climático e etéreo - e às vezes pode ser cansativo. Parece que tudo foi planejado para soar como a expressão musical de um sonho iluminado e fugaz.
É um dos lançamentos mais perturbadores de 2007, ao lado de "Here We Go Sublime", do The Field e "Volta", de Bjork.

domingo, 13 de maio de 2007

O Dia em que a Ferrugem se Alastrou

20 de janeiro de 2001.Uma hora da manhã. Dia de menor público do Rock in Rio 3. Todos confortavelmente distribuídos num longínquo e enorme descampado da Barra da Tijuca onde foi erguida a Cidade do Rock.
Boa parte dos espectadores já havia deixado o local, depois de ter assistido aos desprezíveis shows de Kid Abelha, Sheryl Crow e Dave Matheus Band. Afinal, por que esperar pela apresentação daquele artista obscuro que iria encerrar os trabalhos do dia?
Apenas parte do imenso palco, cuja escuridão é quebrada parcialmente pelas vacilantes luzes de velas, será utilizada. A expectativa pelo início do show paira no ar e é quase palpável. Até que os primeiros acordes de "Sedan Delivery" são executados. O clima agora é de comoção. Não por qualquer tipo de efeito especial ou telões de última geração. Mas sim pela fúria, lirismo, autenticidade e integridade artística que são instaurados e serão despejados incessantemente a partir de então por Neil Young. Ele, secundado por sua banda de apoio Crazy Horse, é o responsável por alguns dos mais sublimes momentos de distorção, microfonia e improvisação já registrados. A diferença naquele momento era que tudo estava ali na frente, a alguns metros de distância.
Neil, trajando uma calça jeans surrada, camiseta branca e chapéu, emenda uma música na outra. Parece totalmente absorto pela arte que produz. Balança em transe, ao som das notas da guitarra. Em "Down By the River" uma corda arrebenta e ele segue solando, gerando perfeição da imperfeição. Quase não emite palavras. Não há espaço para presepadas, discursos messiânicos, frases feitas e quetais.
O set explora a vertente elétrica da obra de Neil. Isso significa barulho, feedback e blocos sonoros de alta densidade combinados com melodia e harmonia. Pedradas como "Fuckin'up" e "Rockin' in the Freeworld" são desferidas. Cortesia do "velhinho" que influenciou toda uma linhagem roqueira que vai de Sonic Youth, passando por Pixies, e chegando a Nirvana. Clássicos são perfilados. Há momentos arrebatadores como as longas versões de "Like a Hurricane" e da arrepiante "Cortez, the Killer". Em "Hey, Hey, My, My" e "Powderfinger" era possível ver pessoas chorando na platéia. Uma palavra resume tudo: catarse.
Depois de alguns anos posso reafirmar que se existem manifestações artísticas antológicas e transcendentes, esse show de Neil Young foi uma delas. Tenho orgulho de tê-lo presenciado. Rust Never Sleeps.

quinta-feira, 19 de abril de 2007

Kind of Blue. Ouça o disco. Compre o Livro.

Nas últimas duas semanas foram freqüentes os comentários na mídia a respeito do lançamento do livro "Kind of Blue", de Ashley Kahn, que disseca o antológico disco homônimo de Miles Davis. A publicação foi capa de cadernos culturais, colunistas, musicais ou não, saudaram o seu lançamento, e mesmo blogueiros de formação mais roqueira renderam-se a esse que se transformou num verdadeiro acontecimento do mercado editorial. Nada mais justificado.
Acredito que não estamos diante de uma obra que se tornará um best seller, porém o seu lançamento representa o enriquecimento de um nicho literário pobre no Brasil, relativo à publicação de livros musicais, notadamente de jazz. Esse é um dos motivos pelos quais foi gerado o frisson que "Kind of Blue", o livro, que saiu no exterior num distante ano de 2000, tem causado por aqui. Some-se a isso a riqueza do texto de Kahn. Contém informações até então pouco conhecidas e preciosas, na medida em que o acesso às fitas originais das sessões de gravação na Columbia Records foi-lhe garantido, propiciando que os bastidores fossem retratados com fidelidade. Cada música é esquadrinhada magistralmente, uma a uma, revelando inclusive o ambiente que cercou a execução de cada qual. Aí só resta ao leitor tornar-se concomitantemente ouvinte, tocar o cd e perceber todos os detalhes e nuances.

Outro mérito é a abordagem histórica, a contextualização do álbum no tempo. Dentro dessa proposta, o autor encara com propriedade e dados técnicos o modalismo que norteou e permeou toda a obra, culminando com a criação do chamado jazz modal em contraste aos preceitos do bebop. Os protagonistas responsáveis pela realização dessa obra-prima da música do século passado, os gênios Miles Davis e John Coltrane, além dos soberbos Cannonball Adderley (sax alto), Bill Evans (piano), Winton Kelly (piano em "Freddie Freeloader"), Paul Chambers (baixo) e Jimmy Cobb (bateria), também tem seus perfis rascunhados em passagens reveladoras, o que contribui para a familiarização do leitor com as suas personalidades. É possível constatar, assim, a fundamental importância de Evans para a gestação de "Kind of Blue" e sucesso do jazz modal, mesmo não sendo creditado em composições como "Blue in Green", assim como a irresistível escalada de Davis rumo ao sucesso artístico e de público. Muito interessante também a figura de um Coltrane em transição, gestando nessa época de modalismo o passo revolucionário que em seguida viria a dar, impregnando de profunda espiritualidade a sua técnica.
P.s.: Ashley Kahn também é autor de outro livro nos mesmos moldes do aqui abordado sobre outra pedra de toque do jazz, "A Love Supreme" de John Coltrane. Vamos rezar pra que seja lançado também! A propósito, por onde anda a autobiografia de Miles, impossível de ser encontrada atualmente em qualquer livraria?

quarta-feira, 28 de março de 2007

O Cheiro do Ralo

Foi apenas na Bienal do Rio de 2005 que deparei com a obra de Lourenço Mutarelli, apesar das muitas referências anteriores elogiosas ao seu trabalho. Entrei no stand de quadrinhos sem pretensão alguma, sem procurar por nada em especial, já que o meu ponto de contato com esse universo desaparecera no estertores da adolescência, quando deixei de colecionar as seis publicações da Marvel de que gostava (interessados em adquiri-las, por favor, manifestem-se). Porém, após folhear algumas revistas e me impressionar com o universo "sujo" e marginal de Muta, que me fez lembrar o genial (e não menos estranho) Robert Crumb, acabei sendo fisgado mesmo pelo nome daquele livrinho: "O Cheiro do Ralo". Não hesitei. Comprei de imediato. A leitura foi rápida. Narrativa direta, baseada em diálogos, quase uma história em quadrinhos sem quadrinhos, quase um roteiro pronto para ser filmado. Um protagonista misantropo e repugnante, homônimo do autor, compraz-se em humilhar pessoas que, em busca de um trocado, procuram-no para vender objetos, dos mais prosaicos aos mais esdrúxulos. Um anti-herói perseguido pelo cheiro fétido proveniente de seu banheiro e apaixonado por uma... Bunda. O universo eminentemente urbano e outsider, o submundo, a metáfora escancarada do ralo, a abordagem do lado podre da vida e o humor negro subjacente acabam, paradoxalmente, seduzindo o leitor de imediato e fazendo daquela leitura um momento marcante.
Mais ou menos na mesma época, era lançado nos cinemas "Nina", primeiro longa-metragem de Heitor Dália, cineasta pernambucano radicado em São Paulo. O filme traz desenhos fantásticos de Mutarelli, que enriquecem o jogo de contraposições real-imaginário proposto na película, servindo de precioso recurso estético/narrativo. A parceria prosperou e o passo seguinte foi a adaptação para as telas, propulsionada pelo ator e produtor executivo Selton Mello, daquela publicação de nome nada comercial (a captação de recursos sofreu restrições por causa disso). E assim, sem dúvida, o marasmo reinante em nossas telas foi quebrado com a chegada do "Cheiro do Ralo" aos cinemas. Mérito de um consórcio de artistas que não tratam sua arte como mera mercadoria gestada segundo os cânones de estratégias mercadológicas baratas e assumem o risco de propor reflexões relevantes em suas obras, sejam sobre estética ou conteúdo.
A partir do primeiro fotograma, sentimos o desagradável odor, assim como ele é percebido assim que abrimos o livro. Lá está o grotesco Lourenço (embora menos virulento do que achei quando li o livro... enfim, subjetivismos) numa interpretação perfeita de um Selton Mello com sotaque e ares de Zé Dirceu (desculpe, mas nesse ponto a associação entre essa emérita figura da nossa República e o tema "merda" é inevitável). Aliás, o que é aquele seu choro compulsivo no momento enternecedor do encontro com a bunda? Inacreditável...
O elenco de apoio também se destaca, encarnando os tipos urbanos decadentes que freqüentam a loja do protagonista, entre eles a viciada interpretada por uma excelente Silvia Lourenço (de "Contra Todos"). Atenção ao trabalho dela!!! Até Muta desempenha com propriedade o papel de segurança! O filme padece, no entanto, de um mesmo defeito que acomete o livro, isto é, uma circularidade, uma repetição excessiva da situação "Lourenço recebe um cliente e o humilha". No fundo, nada que comprometa. Afinal, o filme, repetindo o que proprociona o livro, constrói com exatidão o perfil de um escroque, fetichista contumaz e coisificador ordinário. Mais atual impossível. O cheiro do ralo está entre e nós e anda se espalhando...

quinta-feira, 15 de março de 2007

Borat

O filme é muito mais do que uma comédia que objetiva arrancar risos desenfreados dos espectadores. É verdade que há momentos em que a platéia se descontrola de tanto rir em situações de humor puramente grosseiro, como na grotesca, certamente escatológica, cena em que Borat, o aloprado repórter vindo do Cazaquistão, e seu fiel escudeiro-produtor atracam-se nus num quarto de hotel. Há também um apelo para o absurdo: tenha-se em mente o Dom Quixote e o Sancho Pança "gauches" e pós-modernos, secundados por um urso pardo, "cavalgando" um carro decrépito pelas estradas da América, abusando de anarquia e iconoclastia.
No entanto, o que realmente mais me impressionou e instigou foi o artifício utilizado para através da "parcela ficção" corporificada na comédia (personagens fictícios, situações pré-concebidas para gerar humor) serem revelados "flashs" do real sonho americano - que bem poderia ser um pesadelo - e do verdadeiro "american way of life". Daí porque pode também ser considerado um eficiente documentário. Assim, por exemplo, o FICTÍCIO jornalista anti-semita, sexista, racista e homófobo, habilmente extrai de alguns de seus entrevistados, que evidentemente acreditavam que seus lamentáveis dizeres ficariam restritos a uma aldeia miserável do Leste Europeu, declarações ESPONTÂNEAS/REAIS de cunho igualmente fascista. É o que acontece no episódio do rodeio e no dos universitários. Nem tudo são risos histéricos, portanto. Em passagens, como estas, o filme ganha um feição de amargor. Borat, o exótico, inoportuno, rude e imbecil habitante do Cazaquistão, ao contrário do que poderia ser imaginado, encontra pontos de contato com os bem-sucedidos, desenvolvidos, em suma "superiores", norte-americanos. Funciona como um espelho que destrói o simulacro, revelando o indesejável.
E a estocada mais virulenta vem quando, sob o pretexto de cantar em um rodeio no Texas (significativo, não?) o hino cazaque traduzido sobre a melodia do hino dos EUA, Borat desvela as entrelinhas do pensamento e do discurso do americano médio, muitas vezes escondidos sob belas palavras e conceitos, evidenciando todo o conservadorismo que acomete aquela nação numa era sob o signo das trevas de Bush.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Chico Buarque no Canecão

Depois da tentativa frustrada de comprar ingressos para o show anterior de Chico Buarque, "As Cidades", de 1998, tudo parecia caminhar para o mesmo desfecho no espetáculo "Carioca". Culpa do arcaico e famigerado Canecão, pródigo em dificultar ao máximo a venda de ingressos para quem não paga inteira e onde os cambistas parecem sentir-se em casa ...
Por sorte, datas extras foram marcadas e finalmente pude assisitir a uma das cada vez mais raras e disputadas apresentações de um dos mais importantes artistas da música brasileira. Não consegui achar qualquer defeito no show. Esse é pra guardar pra sempre na memória! O espetáculo é calcado nas músicas do disco "Carioca" (todas são apresentadas), e então confirma-se o fato de que estas ficam mais atraentes a cada nova audição. São canções que, em alguns casos, podem não gerar uma empatia imediata com o ouvinte. Porém, são mais complexas harmonicamente, possuindo nuances, sutilezas, que vão sendo desveladas aos poucos, mostrando, ao final do processo de ambientação, toda sua força. Ao vivo, são belíssimas. "Imagina", então, composta por Tom Jobim, e cantada em dueto com Bia Paes Leme, é pra deixar qualquer um flutuando. Destacam-se também o moderno repente-rap "Ode aos Ratos", além de "Subúrbio".
Um capítulo à parte é a banda de apoio. Um verdadeiro "dream team" de músicos... E ainda por cima entrosados pelos muitos shows da turnê. Covardia... Chico soube fazer-se acompanhar muito bem. Lado a lado, vemos na bateria o mítico Wilson das Neves, que ainda canta desenvolto com Chico a parceria "Grande Hotel", Jorge Helder (autor da intrincada e bela "Bolero Blues"), no baixo, Luiz Cláudio Ramos, no violão e guitarra, Chico Batera, na explosiva percussão... Sem falar do ótimo cantor que Chico é. Longe de virtuosismos, porém extremamente seguro em suas interpretações.
Entremeadas com a nova produção, somos brindados com clássicos como "O Futebol", "As Vitrines", "Futuros Amantes", "Eu te Amo", "Quem te viu, quem te vê" e a maravilhosa "João e Maria", de Chico e Sivuca, oriunda de "O Grande Circo Místico". Estas duas últimas dão um fecho magistral ao show, com a platéia toda de pé, extasiada e rendida ao talento de um Chico nitidamente feliz, que durante todo tempo exibe um carisma magnético sem precisar ou querer fazer qualquer esforço. Depois desse fecho, só resta sair, com a alma revitalizada, tendo ao fundo o "Trenzinho do Caipira", composta por outro gênio, Heitor Villa-Lobos...

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Grandes Discos de 2006 ouvidos apenas em 2007 (Parte II)

"Night Ripper"- Girl Talk.
Colagem eletrônica, nos moldes das realizadas pelo "2 Many Dj's". Contém "samples" de uma infinidade de músicas, sucessos ou nem tanto, de artistas díspares, como "Pixies", "Steely Dan", "The Verve" e "Oasis". É divertido tentar reconhecer essas referências, embora depois de algum tempo a brincadeira acabe ficando cansativa. Por isso, não se pode dizer que seja propriamente um grande álbum.
"Boys and Girls in America"- The Hold Steady.
Guitarra, baixo e bateria vigorosos. Um ou outro eventual teclado, como pano de fundo. Nada de experimentalismos. Rock básico e eficiente, sem firulas e de sotaque sulista, embora a banda seja de Nova York. O brilhante vocalista, Craig Finn, parece ter a voz calejada por litros de whisky. Em alguns momentos lembra "Black Crowes" e "Kings of Leon", além dos pais do gênero, "Lynyrd Skynyrd" e "Allman Brothers". Isso sem falar de Bruce Springsteen...
"Writer's Block"- Peter Bjorn and John.
Excelente álbum da banda sueca. Sem dúvida, um dos melhores de 2006. Ambientação "indie" em que dissonâncias de guitarra convivem com perfeição com melodias assimiláveis e harmonias envolventes. Destaque para "Objects of my affection" (parece um "Wedding Present" revivido), "Young Folks" (assobio e seção rítmica contagiantes) e "Start to Melt".
"Silent Shout"- The Knife.
Duo eletrônico sueco, formado por irmão e irmã, bastante influenciado, como não poderia deixar de ser, por "Kraftwerk", sem deixar de lado elementos do "synth pop", estilo anos 80, o que faz com que o disco seja, ao mesmo tempo, complexo e acessível, sofisticado e descomplicado . A faixa de abertura homônima é sensacional: sintetizadores evoluem com um grave contagioso que pontua toda a música. Foi eleito álbum do ano pelo respeitado site "Pitchfork".

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Grandes discos de 2006 ouvidos apenas em 2007 (Parte I)

"The Crane Wife"- The Decemberists.
Nítidas influências de folk e rock progressivo. Em algumas faixas soa como o R.E.M dos primórdios, em outras parece uma banda progressiva típica, como Jethro Tull. Por outro lado, a vibrante música "The Perfect Crime #2" é um cruzamento da "new wave", estilo "Talking Heads", com a faceta mais "funky" dos "Stones".

"Ballad of the Broken Seas".
União inusitada entre Mark Lanegan (ex-Screaming Trees e colaborador bissexto do Queens of the Stone Age) e Isobel Campbell (do Belle and Sebastian). O álbum aposta, com sucesso, no contraste entre a rispidez de Lanegan e a doçura de Isobel. Climas sombrios combinados com momentos de enlevo.

"Brightblack Morning Light"- Idem. Quase que totalmente instrumental e tributário à Black Music, notadamente à chamada "Blaxploitation". Elementos eletrônicos combinados com instrumentos de sopro e percussão. As músicas andam sempre lentas e viajantes, criando um ambiente lisérgico.

"We are the Pipettes"- The Pipettes.
A palavra chave aqui é entretenimento. As três inglesas promovem uma divertida e despretensiosa reformatação do pop de grupos vocais femininos dos anos 60. Excelente produção em que os vocais bem coordenados e as orquestrações envolventes ganham destaque. Se você quer algo na linha Spice Girls, Pussycat Dolls ou congêneres, passe longe!

"The Trials of Van Occupanther"- Midlake.
Mais um da linhagem folk. Influenciado por todos os grandes nomes dessa vertente musical. A brilhante faixa de abertura, "Roscoe", lembra muito o Fleetwood Mac dos bons tempos, fase "Rumours". Muitos vocais harmônicos, flautas, violões e pianos.

"Everything All the Time"- Band of Horses.
Banda flagrantemente calcada na sonoridade do gênio Neil Young (até o falsete está presente). Mais uma prova de que este, sem dúvida, é um dos artistas mais influentes da história do rock As guitarras sempre interagem e duelam, criando viagens ao mesmo tempo harmônicas e furiosas. Em outras passagens o clima é acústico. Encontra paralelo com "My Morning Jacket".

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Mutantes no Vivo Rio

As ações são comandadas por Sérgio Dias. Ele é o frontman. É o protagonista, o porta-voz e gestor da banda, que ainda esbanja talento tocando guitarra com a conhecida competência.
Arnaldo Baptista está claramente fora de sintonia. Em algumas canções quase é atropelado pela banda. Tem os olhos sempre atentos ao monitor instalado à sua frente. Estaria lendo as letras? As silibrinas do tempo definitivamente não o favoreceram. Mas lá está o iluminado criador das dezenas de músicas geniais espalhadas pelos discos dos Mutantes. Isso sem falar das canções de seu álbum solo, "Lóki?", um dos mais fundamentais registros do rock nacional.
Zélia Duncan contenta-se em secundar os irmãos. Coloca-se num reverente segundo plano. Está discreta e longe de pretender emular uma nova Rita Lee. Dinho, o baterista, faz a sua parte sem muito brilho.
Além deles, o palco está povoado de outros músicos contratados. Apesar da competência de todos, tal fato contribui para descarecterizar a banda. E essa descarecterização, agravada pela ausência de Rita Lee e de Liminha, e pela má forma de Arnaldo e Dinho, é o ponto negativo desse retorno. Assim, em determinados momentos o show parece um "auto-tributo". São os Mutantes homenageando a grande banda do passado, os Mutantes, ou seja, eles mesmos. A grosso modo, por vezes surge um climão de show homenagem, no estilo do que o Multishow produziu para Raul Seixas.
Porém, apesar de tudo, como admirador imparcial dos Mutantes, devo reconhecer que os aspectos positivos suplantam os negativos. A verdade é que show foi muito bom! Paradoxalmente, considerando o que disse antes, admito também que a banda de apoio oferece um excelente suporte. As músicas são executadas com brilhantismo e fidelidade, respeitando a sonoridade do grupo. Em algumas passagens, como em "Dia 36" e "Ave Lúcifer" a psicodelia está lá, restabelecida com exatidão. E teve muito mais, como as memoráveis execuções do proto-hardcore "A Hora e a Vez do Cabelo Nascer", das plácidas "Fuga n. 2" e "Le Premier Bonheur du Jour" e da bem-humorada "El Justiciero", em que os "comparsas" Chávez e Lula entram na roda de ironias. Enfim, o manancial de inúmeros clássicos, aí incluídos "Ando Meio Desligado" (cantada em português por imposição da platéia), "Baby", "Panis et Circensis", "Balada do Louco", entre outros, é despejado sobre o público que empolgado, pede em uníssono, mas em vão, por mais alguns minutos de espetáculo.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

Caetano no Morro da Urca

Hordas heterogêneas lotavam o bondinho para assisitir ao show de Caetano no Morro da Urca. Havia os representantes do momento seminal de sua carreira, desfilando os seus visuais Anos Setenta, na modalidade "típica" ou "atualizada". Outros, vestindo inadequados paletós, provavelmente rendiam homenagens à infeliz fase Fina Estampa. Até mesmo os aficionados pela vertente brega caetânica estavam lá, provavelmente indóceis para ouvir aquela versão da música do Peninha. Enquanto isso, os apreciadores e conhecedores apenas de sua faceta radiofônica das "light" FM's esperavam por algo na linha "Você é Linda" . Além disso, no anfiteatro conviviam pretensas encarnações de meninos do rio e tigresas com turistas estrangeiros perdidos e senhoras na faixa dos 70.
Quanto a mim, já estaria contente em ver o Caetano musicalmente rejuvenescido que se ouve no sensacional "Cê", e presenciá-lo executando alguns dos clássicos do imprescindível "Transa". Será que seria pedir muito que ele tocasse a cartática "Triste Bahia" feita sobre poema de Gregório de Matos? Foi. Mas fiquei contente em ouvir "Nine out of Ten" e a soberba "You Don't Know Me" com suas citações, especialmente à "Reza", de Edu Lobo. Laia Ladana Sabatana Ave Maria!!. E o que falar de "Como Dois e Dois", que levou a platéia ao arrebatamento? E a incrível última música, uma "cover" de Jorge Ben, que fechando apoteoticamente o espetáculo, oferece uma samba-jazz-rock furioso e inebriante?
No mais, Caetano desfila praticamente todas as músicas de seu último álbum, com exceção (graças a Deus!) daquela patética em que emula um português em seu "estou-me a vir" incessante. O que vemos no palco é um artista renovado, extremamente estimulado com sua música, talvez pela revitalizadora injeção de hormônios em ebulição de "Cê". O agora "rocker" Caetano é acompanhado por uma excelente banda básica. Guitarra, baixo, bateria e um eventual teclado "Rhodes", tocados com muita competência, às vezes com sutileza, às vezes com fúria. Isso tudo aliado à habitual excelência de canto e de interpretação. Gostaria de ter ouvido apenas um som ainda mais alto, com ainda mais microfonias e "digressões guitarrísticas" em músicas enérgicas como "Rocks" e "Odeio". Mas a verdade é a seguinte: o ano musical começou em altíssimo estilo!